20 junho, 2024 Diário de uma mulher séria - Parte 1
Venho aqui fazer uma denúncia: uma vergonha, um escândalo!
Sou uma mulher séria. Para mim, isso não é negociável. Sou pela moral e pelos bons costumes. Fui educada assim. Desde muito cedo subscrevi as boas regras da civilidade e custa-me muito ver um mundo onde o respeito já não tem o valor de outros tempos.
Eu sei que me chamam beata, púdica, seca, frígida... Chamam-me assim nas minhas costas, porque cobardes que são nem têm coragem de mo dizer na cara. Mas, mesmo que dissessem, não mudaria nada, pois sou como sou com muito orgulho.
E é por isso não posso compactuar com o que está a acontecer na hospedaria onde vivo há mais de 15 anos... É o que venho aqui denunciar. Uma vergonha, um escândalo!
Claro que vivo sozinha. Nunca tive filhos, pelo que também não me interessa ser mãe de nenhum homem, nem mãe, nem empregada. Ou escrava sexual, que é o que todos querem, pois o que eles querem é prender-nos, duma maneira ou doutra.
Não julguem que por dizer isto eu odeio homens, não é verdade, apenas os acho uns porcos sujos e peludos e não gosto deles, porque não gosto que ninguém mande em mim. Vi como o meu pai, que era sujo e peludo, tratava a minha mãe, e desde muito cedo soube que não era para mim.
Os únicos homens de respeito que conheci foram os que ofereceram a alma ao criador, porque os demais preferem entregar o corpo ao diabo. Para isso, não contem comigo.
Aliás, nem sei como eles conseguem andar com aquelas coisas penduradas dum lado para o outro. É nojento. Basta olhar para um para se ter a certeza que os homens descendem do macaco. Só de pensar em tocar-lhes me dá ânsias. Já as mulheres descendem das fadas, só é pena serem tão putas. Se fossem sérias como eu, talvez as respeitasse mais. Assim sendo, não é o caso.
Seja lá o que for que os motiva, a eles e a elas, a deitarem-se uns com os outros e a trocarem os respectivos fluidos e excrescências, o mundo seria um lugar infinitamente melhor se todos partilhassem os meus valores. Decência, moral e família, é o que faz uma sociedade fortalecer-se. Não são com certeza os macacos...
Quando entrei na hospedaria, há 15 anos, fui para o quartinho dos fundos, era muito nova e inocente, mas hoje ocupo a maior suite da casa, a única com casa de banho privativa. Consequências da senioridade, sim, mas também do valor que acrescento à organização do lugar. Praticamente, tornei-me um membro da família e consideram-me imprescindível na gestão da empresa.
Claro, foi assim até a dona se reformar e o sobrinho vir tomar conta do negócio. Aconteceu há menos de 15 dias e já tudo mudou. Uma vergonha, um escândalo!
Quando eu dava as ordens, qualquer candidato a uma vaga de hospedagem passava por um escrupuloso processo de selecção. Em duas semanas, tudo se alterou e agora qualquer pessoa entra, não interessa a sua origem ou o seu ofício.
O novo proprietário considera-se um democrata, mas eu sei o que é que ele é - um sem vergonha, um despudorado que não quer saber de nada!
Já várias pessoas das mais antigas se foram embora contra vontade, pois ele disse-lhes que a mensalidade que pagavam não se coadunava com a economia actual. No seu lugar, entraram nem lhes vou dizer o quê, uma vergonha, um escândalo... Ele é comerciantes, ele é jornalistas, ele é artistas que não têm onde cair mortos, ele é representantes de organizações estrangeiras… Meu deus, até políticos...
Mas o pior são as liberdades! Dantes andava-se pelos corredores e não se via uma pessoa descomposta, não se ouvia um som indiscreto. Agora, passeiam-se praticamente nus por todo o lado, toda a gente toca em toda a gente, toda a gente se agarra e se apalpa, quer seja o seu par de direito, ou apenas alguém que ia a passar...
Para uma mulher séria como eu, é como viver na mansão Playboy. Passo o dia a benzer-me e a rogar pragas ao mundo que permite a evolução de tais criaturas!
O proprietário já me “convidou” a sair, diz que respeita que eu seja uma pessoa antiga (uma “pessoa antiga”, vejam só, uma mulher com menos de 41 anos!), mas que se não estou confortável com o novo estado de coisas, devia procurar outro sítio onde ser feliz.
A minha vontade era dar-lhe um par de estalos para o pôr na ordem, mas ele mede quase dois metros e saiu há pouco tempo dos fuzileiros. Disse-lhe que não ia a lado nenhum, quem é que ia tomar conta dos hóspedes se o fizesse? Ele limitou-se a encolher os ombros e a dizer:
– Como quiser.
De maneiras que, por forma a combater o vício que se instalou dentro de portas, assumi a posição de guardiã moral da hospedaria. Alguém teria que o fazer...
A minha vigília começa logo pela manhã, quando os hóspedes começam a fazer fila para a casa de banho. A promiscuidade não tem hora marcada e não há dia em que não tenha que passar um correctivo em vários. Ele é homens em cuecas e tronco nu a coçar os testículos, ele é mulheres em cuecas e tronco nu a coçar as mamas, ele é homens e mulheres sem cuecas, ele é casais que se comportam em público como se estivessem na intimidade...
Nem tenho coragem de dizer, isto já não é uma casa de bem, é um bordel!
Não dou para tantas ocorrências, tal é o nível de depravação que se instala logo ao raiar do sol. Parece que mal se abrem as portas dos quartos, abre também a época de caça...
Não tenho em mim a energia mental da denúncia, por isso, para perceberem melhor toda esta vergonha, todo este escândalo, deixo-vos algumas páginas do meu diário, como as escrevi na altura...
Dia X - 8h15
A fila para a casa de banho hoje está do pior, parecem animais a sair da jaula... O cheiro é inenarrável, a sovaco, a pés, a sexo cristalizado – a decadência e vício humano!
Como sempre, o casal da suite amarela chegou primeiro, tomam sempre banho juntos. É ela que o obriga. Diz-se que ele tem um caso com uma colega do trabalho e ela, para o controlar, obriga-o a vir-se várias vezes antes de sair de casa, para não ter leite para mijar fora do penico. O pobre rapaz virou escravo dela, o que é bem feita, para variar.
À porta, o senhor L é o primeiro da fila. Voltou a sair só com as cuecas de leopardo, cheias de nódoas à frente. Passa as noites a ver pornografia e já várias vezes o apanharam a espreitar pelos buracos da fechadura. A tanga é tão curta que se vêem os testículos peludos a sair pelos lados. Nunca pára de se coçar...
Atrás dele, as duas miúdas do quarto azul. Ao início disseram a toda a gente que eram irmãs, depois desdisseram-se logo. Como sempre, desfilam pelos corredores como vieram ao mundo. Não têm vergonha nenhuma, nunca põem um soutien, um fio dental, é todas as manhãs o mesmo, ficam abraçadas a tocarem-se nos seios e nos rabos, a beijarem-se de língua à frente de toda a gente, um despudor!
A seguir a elas, o senhor T parece que faz de propósito, veste aquelas calças de licra e vê-se o contorno enorme do seu pénis flácido encostado à perna esquerda. Deve ter uns 20 centímetros mesmo adormecido. Nunca fala com ninguém, embora as meninas (e o senhor P!) não o larguem e não parem de lhe olhar para o chumaço.
Os piores, como sempre, são o casal de estilistas, nem sei porque se põem na fila, acho que nunca tomaram um banho na vida, aqueles cabelos parecem palha...
Esses não se incomodam por nada, parece que já nasceram agarrados. As mãos dele enfiadas nas cuecas dela e as mãos dela enfiadas nas cuecas dele. Beijam-se e apalpam-se e lambem-se e mordem-se como dois animais, não raras vezes têm orgasmos na fila, respondendo aos sons que saem de dentro da casa de banho, onde o casal da suite amarela faz não sei que espécie de amor, pois os dois gritam que nem desvairados...
O senhor L acha que sabe e diz para quem quiser ouvir:
– Está-lhe a ir ao cu!
E ri-se nervosamente e coça-se em baixo ainda mais vigorosamente, com o vulto mole a crescer-lhe dentro das cuecas.
Como de costume, no fim da fila, depois de várias outras criaturas amorfas que nem merecem distinção, está o senhor P. Deixa toda a gente passar à sua frente, pois gosta de ficar a apreciar os rabos dos homens. Ninguém lhe liga, por mais que tente ser simpático.
Eu pareço uma formiguinha a saltitar de uns para os outros, a passar correctivos em cada um deles, conforme os respectivos delitos:
– Páre de se coçar, seu tarado! Meninas, comportem-se, pelo menos ponham a toalha nos ombros! Senhor T, não quer antes ir vestir umas calças com um tecido mais discreto?
O senhor T é casado, mas a mulher nunca sai do quarto. É ele quem lhe leva as refeições e tudo o mais que ela necessita, incluindo o bacio para fazer as necessidades. Dizem as más línguas que a senhora está amarrada à cama, de pernas abertas, refém dos caprichos do marido dotado e dominador.
A outra teoria é que, como ele é muito grande e muitas vezes são ouvidos pelos restantes hóspedes a praticar sexo duro, ela está sempre toda partida, coitadinha, pois não deve ser fácil encaixar aquele membro - nem à frente nem atrás...
O som de gemidos agudos não pára na casa de banho e agora ecoam atrás do senhor T, pois os estilistas já perderam todo o pudor. Tanto as cuecas dela como as dele já estão a meio das pernas, ele com os dedos enfiados na gruta entre a pintelheira dela, ela com a mão fechada no tronco do pau teso do marido.
Em menos de nada, ela está a tremer toda e ele começa a esguichar para cima do tapete. Já nem consigo dizer nada... Meu querido diário, é a podridão, uma vergonha, um escândalo!
Eu falo, digo, aconselho, recomendo... Mas ninguém me passa cartão, ninguém me responde, ou se respondem é para dizer:
– Meta-se na sua vida! Quem é que a nomeou a polícia da casa?
Inevitavelmente, acabo a correr para o meu quarto, dispo-me toda para, ao menos, observar um estado de pureza reflectida no espelho, e choro muito, muitas vezes até adormecer, a imaginar o trabalho que me vai dar tirar mais uma mancha do tapete...
13h28
Entro com a terrina para servir a sopa do almoço e dou de caras com a maior baderna!
Não sei que diabo despoletou os acontecimentos, mas parece que as meninas do quarto azul, afinal, não mantinham o exclusivo entre elas. Precisamente, uma delas, enquanto beijava a outra sentada no sofá, oferecia o rabo ao senhor T, que não se fazia rogado e metia e tirava a sua grande vara até ao fundo.
A rapariga chorava de gozo e de dor, até começar a estremecer inteira, indicando que estava a experimentar um orgasmo anal. Enquanto se vinha, era consolada pelos restantes convivas da casa, alguns deles, vá lá saber-se porquê, usavam máscaras tipo Zorro.
Logo os dois casais da hospedaria se puseram em acção. O da suite amarela no sofá, a mulher toda aberta de costas, com o cu enfiado na pila do marido, a subir a descer enquanto o senhor L lhe esfregava os lábios da cona rapada. Gemia que nem uma perdida, respondendo à dupla estimulação.
Quanto ao casal de masturbadores implacáveis, ela estava de joelhos a chupar o pau do senhor P que, pelos vistos, não era esquisito quanto ao género das bocas que lhe faziam broches, enquanto o esposo ria como um louco à espera da sua vez. Acabaram os dois a esporrar quase ao mesmo tempo, enchendo-lhe a boca de leite.
O cheiro a cu, cona e esperma que se espalhava pela sala era de revirar as tripas...
Entretanto, as duas jovens largaram os homens e começaram a masturbar-se uma à outra vendo os outros foder. As duas eram rapadíssimas e as rachas abertas brilhavam como se estivessem envernizadas.
O senhor L, a esfregar o pau murcho, era o único que parecia não encontrar conclusão. Em vão, tentava bater uma punheta, mas acho que o seu pénis já nunca ficava duro devido ao excesso de uso. Ainda assim, não parecia contrariado com o problema, pelo contrário, parecia deliciado com o quadro pornográfico que se desenrolava à sua frente, sem nem precisar de ecrã.
Enquanto o deboche durou, ninguém olhou para mim, era como se eu fosse invisível. Mas quando o senhor T olhou para mim com olhos esfomeados, larguei a sopa e corri para o meu quarto.
Chegada lá, chorei muito! Queria dormir, queria esquecer, mas não conseguia tirar a cena dos meus olhos... Meti-me no duche, virei a mangueira para mim e lavei-me por baixo durante muito tempo, como se ao esfregar-me pudesse limpar os pecados dos outros.
De súbito, senti-me desmaiar. Queria gritar, mas abafei os meus próprios gemidos. Fiquei muito tempo prostrada na banheira, até que consegui arrastar-me para a cama e voltei a deitar-me, mas sem esquecer por um só momento o inferno que testemunhei...
Diário de uma mulher séria - Parte 2
Armando Sarilhos
Armando Sarilhos
O cérebro é o órgão sexual mais poderoso do ser humano. É nele que tudo começa: os nossos desejos, as nossas fantasias, os nossos devaneios. Por isso me atiro às histórias como me atiro ao sexo: de cabeça.
Na escrita é a mente que viaja, mas a resposta física é real. Assim como no sexo, tudo é animal, mas com ciência. Aqui só com palavras. Mas com a mesma tesão.
Críticas, sugestões para contos ou outras, contactar: armando.sarilhos.xx@gmail.com