15 junho, 2023 Um dia só teu...
Precisas de te sentir zangada para fazeres o que queres fazer. Para haver um motivo para a revolta...
Acordas com tanta tesão que o primeiro instinto é afastares-te do teu marido. Afastares-te ou afastá-lo, vai dar no mesmo. Sabes que hoje ele não te pode satisfazer...
Desde logo, porque nem imagina o que tu queres. Não conhece essa parte misteriosa de ti. Nunca lhe confessaste os teus devaneios mais obscuros. As tuas loucuras obscenas nunca vieram à baila nas conversas de cabeceira, no pequeno ritual conjugal de partilhas da vossa intimidade. Porquê? Por nada, por timidez, por respeito à sensibilidade dele, por receio de que te ache indigna...
Portanto, ele desconhece por completo que tens dias assim, em que só queres “ser fodida como nunca ninguém te fodeu”.
Ele adora-te e adora o sexo contigo, mas não está na sua natureza perscrutar nos teus enigmas, no lado transcendental da tua perversidade. Nem isso nem foder-te assim. Só hoje, odeia-lo por isso. Nos outros dias todos, ama-lo e ele faz como tu queres, quando tu o queres.
Mas não hoje. Sinceramente, hoje não é dia de tomarem o pequeno-almoço juntos, mesmo que ele se fique a interrogar porquê. Hoje sabes simplesmente que tens que sair dali, o mais depressa possível.
Por isso, despedes-te com um beijo rápido na face, sem lhe dar tempo para perguntas, entras no carro e aceleras na faixa mais movimentada do trânsito, de propósito para que os outros condutores te irritem.
Precisas de te sentir zangada para fazeres o que queres fazer. Para haver um motivo para a revolta. Ou apenas para te desculpares perante a tua consciência…
Para começar, parar na sex-shop e escolher um novo dildo. Não que os teus não te bastem, mas hoje precisas de algo mais impactante. Nada que chegue ao tamanho de cavalo, mas bastante para sentires a cona violada, penetrada pela primeira vez numa abertura maior.
A seguir, entrada no hotel, reservado e higiénico, porta trancada, Please Do Not Disturb.
É isso que precisas: um dia só teu!
Um dia longe de tudo e tu, apenas tu, com o teu corpo e as tuas regras, e as tuas fantasias… Sem os limites e barreiras que te impões e que te impõem nos outros dias.
Nem sequer te olhas ao espelho quando te despes toda, menos as cuecas. Escolheste o modelo transparente para manteres a ilusão de recato. Assim não estás nua, embora se veja tudo, é um ver e não ver... Não gostas de olhar porque, de muitas formas, te enoja precisamente esse recato, que te aprisiona como um colete de forças.
Não. Hoje precisas de estar suja, e de sentir que estás suja, antes de veres o reflexo longínquo do teu corpo nu, transpirado, humedecido, violado... Aí sim, cheia de sumo a escorrer pelas pernas, com a pintelheira polvilhada de gotas de prazer, desejas ver-te ao espelho, nua, suja, anónima, perdida... libertada!
Por isso, preferes o hotel ao teu próprio quarto, embora o teu marido não esteja em casa e só volte muito mais tarde, quando vier do trabalho. Em casa não terias a sensação de transgressão. É isso que procuras, que desejas… Que precisas.
Entras na cama e masturbas-te durante quase uma hora, e as sucessivas explosões fazem-te entrar numa espécie de transe. A tontura dos orgasmos praticamente faz-te perder os sentidos. Saciada, acalmada, dormes na poça de mel lúbrico que tu mesma derramaste.
Debaixo do cobertor o cheiro é intenso, a sexo e suores íntimos e, por um momento, afligem-te as manchas no lençol, o que irá pensar a camareira quando estiver a mudar a cama? Felizmente, adormeces antes de a vergonha te apanhar.
Em sono profundo, hibernas a impaciência e as fantasias. Ou será que não...?
Seja como for, não dás por nada quando ele chega.
Não sabes quando ele entrou. Não fez barulho, ou não ouviste, abandonada como estavas no sono escuro que fica da masturbação.
Não deste por ele levantar o cobertor e deparar com o teu corpo praticamente nu, cheio de nódoas de humidade nas cuecas transparentes, que dessa forma ficavam ainda mais transparentes.
Não sabes o tempo que passou a olhar-te o olho do cu escancarado e gelatinoso, ainda aberto pelo vibrador, e o rasto líquido que descia pelo rego e denunciava, da mesma forma opaca, os lábios humedecidos e semi-abertos da cona.
Não o sentiste, nem pressentiste, enquanto ele te observava o corpo inteiro e via o grande dildo, ainda cheio da tua geleia, ao teu lado na cama.
Nem ouviste como a respiração dele acelerou ao ver-te assim, vulnerável e pronta a usar, a cheirar a sexo por todos os poros...
Só o sentiste mais tarde, quando ele te puxou o cabelo e te apertou um mamilo.
Antes disso, todos os abusos que eventualmente te tenha perpetrado, não te lembras de nada.
Despertas nessa carícia com um susto, que te sobressalta mas, por algum motivo, não te aflige. Deixas-te ir no seu embalo sensual, recebendo-o como quem sente na pele um toque dado num sonho.
Provavelmente, é esse o teu sítio de momento: ainda não sabes se ele é real (...será?), ou se tudo não passa de um sonho erótico remanescente dos orgasmos.
Sente-lo aproximar, ele chega-se muito perto, tentando medir a tua respiração. Pega no teu braço adormecido, levanta-o e deixa-o cair como morto. Repete o gesto e confirma o que quer saber: que continuas profundamente adormecida; que ele pode fazer-te o que quiser sem encontrar resistência.
Tu sentes tudo isto, mas não fazes nada. Alimentas a ilusão. A dele e, principalmente, a tua.
O que interessa se é real ou não, desde que vá ao encontro das tuas fantasias? É aí, nessa decisão, que decides ficar. Aconteça o que acontecer.
Ele já te massajou o corpo todo, do pescoço à ponta dos pés. Os seus dedos, suaves e intrusivos, fizeram o reconhecimento total das tuas formas adormecidas. Sentiram a fluidez abandonada da carne e a humidade abundante das grutas.
E tu sentes quando te baixa as cuecas e te cheira profusamente, e termina a lamber-te toda a área íntima, a cona primeiro, depois o buraco do cu.
Sentes cócegas quando ele manobra com a língua no teu olhinho traseiro, mas não fazes um único gesto. Ilusão ou real, não queres fazer nada que perturbe o momento. Não te mexes, não reages, não fazes um único som.
Nem mesmo quando ele, abrindo-te muito as nádegas, coloca a glande gorda do dildo na entrada no teu ânus. Muito devagar, com receio que a dor te desperte, enfia-o até meio. Depois deixa-o aí estacionado e começa a masturbar-se.
Tu não vês, porque estás de costas para ele, de rabo ao léu, mas de algum modo sabes que ele está muito duro e muito grosso atrás de ti. Quem não estaria, ao observar uma mulher bela como tu, assim impotente, submetida, disponível, escancarada... com meio dildo enfiado nas bordas do cu?!
Só a imagem seria suficiente para qualquer homem correr logo ali meio litro de esporra...
Tu não vês, mas sentes o cheiro a caralho anónimo que se espalha pelo ar, que te entra directamente para as narinas.
Então ele começa a empurrar e tirar o dildo, primeiro num ritmo lento, depois cada vez mais rápido. Sentes as pregas do cu a estalar, a dor misturada com prazer, e nessa altura fazes um esforço inumano para não suspirar, para não gemer, para não gritar. Para ele não saber que estás acordada. Para não quebrares o feitiço…
Não queres que nada interrompa esse momento. Queres que ele continue, que te viole no sono, que te use o cu como quem fode uma saca de batatas, sem querer saber se dentro dele há uma alma, um espírito sensível de mulher púdica e bem comportada.
Queres que ele te parta toda, que destrua o teu lado correcto, a fachada que as boas esposas publicam por exigência dos maridos.
Não queres pensar em nada disso, só em deixar tudo para trás. Só queres mesmo que ele estilhace essa existência, que te enfie o rolo gigante até te saltarem lágrimas do cu!
Há pelo menos 10 minutos que te enraba com a pele plástica do dildo e agora decide que quer mais. Então tira-to de trás, ajeita-te só o suficiente e enfia-to na cona, até ao fundo. Só aí liga o botão da vibração, e sentes como a cona se alaga subitamente de líquidos e sensações maravilhosas.
Nesta posição, ficas ainda mais à mercê dos seus caprichos e é quando ele te enfia, como tu esperavas, o caralho no cu.
O que se passa a seguir nem tu consegues conceber nitidamente. Ele começa a foder-te o cu devagar, mas em menos de nada está a cavalgar em cima de ti como se não houvesse amanhã. Já nem parece sexo, mas apenas violência. Já não parecem pessoas, mas um par de animais selvagens!
Com a cona cheia pelo dildo enorme e o cu preenchido pelo caralho dele, num vai e vem endoidecido, não podes aguentar mais e vens-te com um urro de bicho, que ensopa ainda mais os lençóis por baixo de ti, para mal dos pecados da camareira que terá que mudar a cama...
Mas agora não pensas nisso, estás-te a cagar para ela, estás-te a cagar para tudo... E por falar em cagar, as estocadas dele são tão fortes que tens medo que ele te arranque o cagalhão quando te sacar a picha do cu...
Porque ele agora já não quer saber que tu grites, ou continues a gemer debaixo dele. Já não quer saber se estás acordada ou a dormir. Continua a enrabar-te como um doido porque, seja como for, estás subjugada, dominada por ele, não há nada que possas fazer para te escapares, para sair da situação.
Subitamente ele pára e tu estremeces. O que aconteceu? Ele pára durante, talvez, 10, 20 segundos, um minuto, não sabes bem.
O que aconteceu?!
Temes que tudo tenha terminado assim, de repente, sem a devida compensação. É quando sentes a tesão num pico que desconhecias ser possível...
A espera, a expectativa, o não saber o que se segue, toda essa angústia, faz-te quebrar a derradeira película, o estreito hímen que defende a mulher digna da mulher que, às vezes, mais do que tudo, tem a necessidade de se sentir puta.
Aí entendes o que verdadeiramente necessitas: que ele, seja lá quem for, rompa essa película, essa última virgindade. Se for preciso que te humilhe como quem puxa o autoclismo, mas que, duma vez por todas, desonre a mulher digna para enfim trazer à vida a mulher puta...
Providencialmente, quando pensas nisso, sem qualquer aviso, ele vira-te o corpo abruptamente e coloca-te de frente para si, e pela primeira vez vislumbra a face honesta da tua tesão, e pela primeira vez tu observas a sua face rude e talvez atraente.
De olhos bem abertos, observa-lo como quem descortina um oásis no deserto. E também pela primeira vez ouves a sua voz, não um pedido, mas uma ordem:
— Abre a boca.
Tu fazes o que ele manda e, acto contínuo, ele esfrega-te o caralho nos lábios, no nariz, nas bochechas, deixando um rasto de aguadilha de cão na tua cara inteira, antes de to enfiar na garganta e desatar a bolsar golfadas de esporra quente, que és obrigada a engolir, já que ele não te sai de cima e te agarra a cabeça contra si, impedindo-te qualquer hipótese de evasão.
Ele vem-se e não pára de se vir na tua boca, em golfadas espessas, maisena de caralho, enquanto te belisca os mamilos e esfrega as mamas, e o vibrador na cona te ilustra uma versão eléctrica do paraíso, que te faz vir outra vez, desta vez aos soluços, com o corpo todo junto. Explodes como se desses à luz, não um filho, mas um orgasmo descomunal, um raio de luz de tal forma absoluto que a rendição te cala...
Assim mesmo, por incrível que pareça, vens-te como uma puta, mas és incapaz de libertar um único som. Tudo é demais…
E uma última vez, no teu dia de idílio, morres para a vida como só um orgasmo é capaz de matar.
Acordas muito mais tarde, resta apenas um fio de claridade no quarto, e não percebes o que aconteceu. Ainda o sentes mas não o vês em lado nenhum.
Ele não te deu um beijo de despedida, não escreveu um bilhete carinhoso, não deixou para trás uma única prova da sua existência.
Não sabes o que se passou, quem era o homem ou se de facto ele existiu. Poderia ser apenas a tua fantasia? O teu sonho?
Talvez mais provável isso que ele entrar e sair sem tu dares por nada...
A próxima hora passa-la sentada numa cadeira diante do espelho, a fumar cigarros (só hoje), de pernas abertas e cona a pingar, completamente nua (não voltaste a vestir as cuecas transparentes), celebrando a tua sujidade, a tua depravação, a gloriosa sensação transgressora da infidelidade fantasiosa...
A imagem que vês reflectida é a de uma mulher que enfim se fez mulher. Que fez o que era preciso para se sentir mulher. E sentes uma infinita compreensão e ternura por ela, por esse outro “tu” que vive do outro lado do espelho mas que, por um dia, um dia só teu, se atreveu a viver deste lado também.
Lá fora o sol já baixou. Toda a pressão matinal se diluiu, o teu espírito sossegou, sentes-te capaz de voltar à vida. Falando nisso, vão sendo horas de te pores a caminho, em breve o teu marido chegará a casa e queres estar lá para o receber.
Ao fim do dia, sentes uma gratidão imensa e precisas de lhe agradecer tudo o que te dá. Mesmo que não te dê sempre tudo o que precisas.
Armando Sarilhos
Armando Sarilhos
O cérebro é o órgão sexual mais poderoso do ser humano. É nele que tudo começa: os nossos desejos, as nossas fantasias, os nossos devaneios. Por isso me atiro às histórias como me atiro ao sexo: de cabeça.
Na escrita é a mente que viaja, mas a resposta física é real. Assim como no sexo, tudo é animal, mas com ciência. Aqui só com palavras. Mas com a mesma tesão.
Críticas, sugestões para contos ou outras, contactar: armando.sarilhos.xx@gmail.com