13 juillet, 2023 A Governanta - Parte 1
A Dona Bete já era uma mulher madura quando entrou ao serviço...
Depois do divórcio com a minha mãe, o meu pai, implacável homem de negócios, conseguiu ficar com a custódia do filho, este mesmo que aqui vos escreve. Mas a única mudança que implementou na rotina foi a contratação de uma governanta...
Fê-lo gastando mundos e fundos, por uma mera questão de afirmação, não obstante ser público o quanto nos odiávamos. Tudo para que no fim das disputas judiciais, a mulher e o filho não lhe ganhassem…
Era assim que via todos os assuntos da vida: competitivo e sem qualquer tipo de emoção.
Para não ter trabalhos comigo, sobrava a sua bateria de criados, que tratavam de todas as minhas necessidades. A única mudança que implementou na rotina foi a contratação de uma governanta, para que alguém desempenhasse o papel de semi-autoridade que ele reservava às mulheres da casa. Para isso e para que não dissessem que educava o filho sem qualquer tipo de referência maternal, sem um toque feminino. Parecia bem.
A decisão tinha a vantagem pública de lhe dar uma imagem de pai preocupado e era menos uma chatice no meio dos seus mil afazeres, pois às mulheres competem esses trabalhos. Não via nele o seu herdeiro, mas também não desejava que o filho saísse estúpido. Ia parecer mal.
No fundo, substituiu uma mulher por outra, já que a atenção que lhes reservava era em tudo idêntica. Não ia para a cama com elas e elas tratavam-lhe do filho. Ele, quando queria foder, recorria a uma agência, mas raramente tinha tempo ou desejo para isso.
De forma que cresci sem pai, mas com todas as a mordomias e mais essa, uma governanta praticamente só para mim, que tratava de todos os aspectos da minha educação. Todos, menos os que poderiam ter feito de mim outra pessoa…
O seu verdadeiro nome era Benedita, mas fazia-me tratá-la por Dona Bete. Já era uma mulher madura quando entrou ao serviço, não era particularmente bonita mas via-se que poderia ser, não fosse o mau feitio e a austeridade que levava para todo o lado. Era viril e austera, zangada com qualquer coisa. Mas tinha uns momentos de fraqueza em que prodigalizava carinhos, que apesar de desajeitados eram carinhos…
Foram esses momentos que me ensinaram a vê-la por baixo daquela mantilha de agressividade e conservadorismos nunca fundamentados. Quando o fazia, quando a via com esses olhos, ela sentia-se e insurgia-se. Via-se exposta… Era como se eu a visse por baixo da roupa.
Para me impedir de a ver, cegava-me às vergastadas. Tinha uma vara de marmeleiro que eu ouvia zunir no ar antes de receber a dor excruciante. Sempre nas nádegas, sempre uma vez de cada lado. Jamais me iria queixar ao meu pai, de maneira que habituei-me. Aprendi a sentar-me de lado e já nem sequer coxeava.
Graças ao estado de espírito natural da Dona Bete e à sua “educação clássica”, tive um despertar tardio em inúmeros assuntos do mundo. Desde logo, o sexo. Tudo o que me foi ensinado era recato e pudor, vergonha e pecado. Até que, eventualmente, o meu corpo deixou de compreender os fantasmas e os medos e partiu para a “iniciativa privada”… E aí, à revelia da sua moralidade, qualquer coisa me dava uma erecção…
Podia ser um som, podia ser um cheiro, e qualquer imagem minimamente sugestiva, um decote, um ângulo, um avistamento de rendas numa perna esguia, me punha o caralho em sentido.
Mais a mais, não era um caralho qualquer. Se nasci privado de outros atributos, nesse campo recebi monumental compensação. Não vou entrar em pormenores mesquinhos sobre medidas instituídas, direi apenas que era duas vezes maior e duas vezes mais grosso do que estão a imaginar.
E aí mudaram todas as formas como observava a Dona Bete. Já não me bastava vê-la por debaixo da roupa... Queria arrancar-lhe a roupa!
Perceptiva como era, ela também percebeu esse olhar.
Prestes a cumprir o meu 23º aniversário, e fruto do poder que sentia entre as pernas, já tinha adquirido alguma voz de comando. A nossa dinâmica transformara-se. Ela já não me dizia o que fazer. Quanto muito, sugeria-o e eu alinhava por razões já estratégicas.
Mas depois, quando eu queria, tinha uma voz afirmativa que não deixava espaço a grandes contestações. Depois dos anos da ditadura, tínhamos agora uma relação de poder consentido, sem esquecer o contexto patronal: eu fazia o que ela pedia, ela fazia o que eu mandava.
Assim a avisei que, para a festa do meu aniversário, recusava a tradicional feira de vaidades organizada pelo meu pai e, em vez disso, preferia um “serão especial”. A sós, com a pessoa mais especial.
Ela começou por balbuciar que o meu pai jamais teria disponibilidade para tal, que a pressão dos negócios, as exigências sociais, as razões políticas, enfim, o supremo interesse nacional… Até perceber o erro: eu não estava a falar do meu pai… estava a falar dela!
Foi a única vez na vida que vi a Dona Bete a tremer.
Não sei o que lhe passou pela cabeça, mas malhei no ferro enquanto estava quente. Em vez de levantar o tom de voz, baixei-o, e a solenidade que isso trouxe às minhas palavras deu-lhes o dobro do corpo.
Não apenas requeria um “serão especial”, como exigia uma prenda especial! Uma prenda que só poderia ser dada pela pessoa mais especial das nossas vidas. Afinal, vivíamos um para o outro, certo?
Dona Bete já não tremia, mas continuava com um ar assustado:
– Tens a voz do teu pai. Nunca tinha percebido…
Não viu outro caminho senão consentir. Era a verdade. Isso pelo menos sabia.
– Que prenda queres, então?
Outras coisas não sabia. Por exemplo, que as suas pedagógicas vergastadas, que antes me provocavam dores atrozes, agora me despertavam erecções monumentais. Que bastava ouvir o zunir da vara de marmeleiro para ficar de pau feito! Que inclusivamente, acabava por ter orgasmos como um reflexo condicionado da sua violência, do seu sadismo…
Nesses momentos, só pensava em dominá-la, em virá-la ao contrário, em despi-la, vergastá-la eu próprio, rasgar-lhe as nádegas com a ponta da vara…
E no fim, esporrar-me para cima dela, como se não passasse de um mero objecto, uma mesa que fica suja depois de comer.
Era assim que arquitectava o meu desejo, foi essa a tesão que me ensinou a Dona Bete.
Assim, disse-lhe o que pretendia, o que esperava dela…
– Toda a vida me disseste o que fazer, não foi Dona Bete?
– Sim...
– Então, nesse dia quero, ordeno, exijo…!
– Sim...?
– Exijo que faças TUDO o que EU disser!
Armando Sarilhos
Armando Sarilhos
O cérebro é o órgão sexual mais poderoso do ser humano. É nele que tudo começa: os nossos desejos, as nossas fantasias, os nossos devaneios. Por isso me atiro às histórias como me atiro ao sexo: de cabeça.
Na escrita é a mente que viaja, mas a resposta física é real. Assim como no sexo, tudo é animal, mas com ciência. Aqui só com palavras. Mas com a mesma tesão.
Críticas, sugestões para contos ou outras, contactar: armando.sarilhos.xx@gmail.com