17 avril, 2025 Trabalho Sexual pelo mundo: entre a regulamentação e a proibição
Qual é o modelo ideal para salvaguardar os direitos dxs profissionais do sexo?
O Trabalho Sexual é encarado de formas bastante diferentes em vários países. Em alguns, aposta-se na descriminalização, em outros na regulamentação da atividade, e há ainda aqueles que têm modelos proibicionistas e abolicionistas. Vamos conhecer as principais abordagens.

Comparar a forma como diferentes países lidam com o Trabalho Sexual é importante, para entender as vantagens e desvantagens das diversas medidas que se podem tomar para proteger os direitos das pessoas que se dedicam a esta atividade.
Por um lado, existe o modelo de descriminalização, onde a Nova Zelândia surge como o exemplo mais elogiado, e onde o Trabalho Sexual é legal e regulamentado, garantindo condições de trabalho mais seguras.
Mas, por outro lado, existem modelos como o abolicionista, praticado em países como Suécia e Noruega, e onde a compra de serviços sexuais é crime, e o proibicionista, em países como EUA, onde o Trabalho Sexual é ilegal.
Cada modelo tem implicações diferentes em termos de direitos humanos, de saúde pública e de combate ao tráfico de pessoas. Vamos, então, avaliar, de forma breve, as principais abordagens existentes...
O modelo da Nova Zelândia para o Trabalho Sexual
Na Nova Zelândia, o Trabalho Sexual foi regulamentado pelo "Prostitution Reform Act" em 2003. Assim, neste país, qualquer cidadão com mais de 18 anos pode vender os seus serviços sexuais de forma legal.
Quem se dedica ao Trabalho Sexual pode definir as suas condições de trabalho, o que significa que pode trabalhar a título independente, em casas particulares, na rua ou em bordéis geridos por outras pessoas.
Quando alguém tem algum tipo de controle sobre quem presta serviços sexuais, precisa de obter um "certificado de operador" junto de um tribunal. Mas xs profissionais do sexo também podem trabalhar em conjunto, como iguais, até um máximo de quatro, sem precisarem deste certificado.
Os bordéis têm de ser autorizados pelas autoridades locais. Algumas localidades não permitem que operem em certas áreas, como próximo de escolas, mas não podem proibir a sua existência.
Os direitos dxs trabalhadorxs do sexo são garantidos pela legislação laboral como acontece com trabalhadorxs de outras ocupações. Também têm acesso a proteção social e à saúde.
Podem ainda recusar clientes sem apresentar uma razão para isso, e ninguém pode obrigar quem faz Trabalho Sexual a ter relações sexuais, mesmo que o cliente tenha pagado.
O modelo neozelandês é visto como o ideal por quem trabalha no apoio a trabalhadorxs do sexo, uma vez que assenta na proteção dos direitos, da saúde e da segurança destxs profissionais.
Apesar do foco na promoção de práticas seguras, não há exigência de testes obrigatórios de saúde para xs trabalhadorxs.
Quem visitar a Nova Zelândia com um visto temporário, não pode fazer Trabalho Sexual. Se for apanhadx a fazê-lo, pode acabar deportadx.
Sabe mais: Reportagem na Nova Zelândia sobre trabalho sexual: Um exemplo para o mundo
Bélgica: Profissionais do sexo têm mesmos direitos que todxs xs trabalhadorxs
Na Bélgica, a descriminalização do Trabalho Sexual aconteceu em 2022, mas em 2024, a lei foi aperfeiçoada para conceder aos profissionais do sexo o mesmo estatuto laboral que é dado aos demais trabalhadores.
Numa decisão inédita a nível mundial, xs trabalhadorxs do sexo passaram a ter acesso a contratos formais de trabalho e a proteções legais semelhantes às dos outros trabalhadores.
Assim, têm acesso a baixas por doença, subsídios de desemprego e de maternidade, e direito à reforma, entre outros apoios sociais.
Também conseguiram outros direitos fundamentais, como a recusa de clientes e a interrupção de um serviço sexual em qualquer momento.
A nova legislação definiu igualmente regras sobre horários de trabalho, remuneração e medidas de saúde e segurança, obrigando os empregadores a fornecerem roupa de cama limpa, preservativos e produtos de higiene.
Os donos de bordéis, ou de casas onde se exerce o Trabalho Sexual, precisam de ter uma licença para o efeito, e devem instalar botões de emergência nos locais de trabalho dxs profissionais do sexo.
Se estes fizerem domicílios, ou serviços em movimento, devem disponibilizar-lhes um botão de alarme móvel.
As licenças só podem ser obtidas por quem não tenha condenações por agressão sexual, tráfico humano, homicídio por negligência, roubo ou fraude. Quem empregar profissionais do sexo sem licença, pode ser condenado por lenocínio.
Quem faz Trabalho Sexual pode também exercê-lo de forma independente.
Lê ainda: "Discriminação dói de maneira brutal". Associações discutiram dificuldades dXs trabalhadorxs do sexo
Países Baixos: legalização com regras muito apertadas
O modelo de regulamentação do Trabalho Sexual nos Países Baixos, é semelhante ao neozelandês, mas com algumas pequenas diferenças.
O país que é conhecido pelo famoso "Distrito da Luz Vermelha" em Amesterdão, legalizou o Trabalho Sexual em 2000, permitindo o funcionamento de bordéis, desde que cumpram normas de segurança e higiene.
Os proprietários de bordéis e xs trabalhadorxs do sexo independentes precisam de se registar e de ter uma licença das autoridades locais.
Mas existem alguns municípios onde o Trabalho Sexual é totalmente proibido, e outros onde a obtenção de uma licença é quase impossível devido a regras muito restritivas.
Trabalhar sem licença é crime, tal como trabalhar em zonas não autorizadas para o efeito. A contratação de profissionais do sexo que não sejam cidadãos da União Europeia também é proibida.
As regras apertadas levam organizações humanitárias a alertar que a realidade dos Países Baixos promove muitos dos problemas que também se verificam nos modelos onde o Trabalho Sexual é criminalizado, nomeadamente a violência.
Devido à legislação muito rigorosa, muitxs profissionais do sexo acabam por exercer a atividade de forma ilegal, o que os torna mais vulneráveis a situações de tráfico humano e exploração.
Outros modelos aplicados ao Trabalho Sexual
Há outros países que têm abordagens distintas quanto ao Trabalho Sexual. Vamos tentar resumir algumas delas, destacando as suas principais características.
Modelo híbrido: Portugal e Espanha
Portugal está entre os países que têm este modelo, em que o Trabalho Sexual não é regulamentado, mas também não é ilegal.
Assim, xs profissionais do sexo não são criminalizadxs, mas a exploração comercial de terceiros é proibida e pode ser punida através do crime de lenocínio.
Não há regulamentação específica para garantir direitos laborais ou proteção social a trabalhadorxs do sexo.
O debate sobre a legalização ou regulamentação continua aberto, com propostas que vão desde a descriminalização total até à criminalização.
Em países como Espanha, que também tem um modelo "híbrido", caminha-se mais para a proibição do Trabalho Sexual.
Modelo legalista: Alemanha e Áustria
Na Alemanha e na Áustria, há uma aposta forte na regulamentação, para que a atividade seja exercida como uma profissão legal.
Assim, xs trabalhadorxs do sexo têm de registar-se e pagar impostos, para ter acesso a direitos trabalhistas. E podem ter contratos formais e acesso a benefícios sociais.
Além disso, devem ter aconselhamento médico, e o uso de preservativo é obrigatório para salvaguardar a saúde pública.
Os bordéis, e outros espaços que disponibilizam serviços sexuais, precisam de cumprir normas rígidas de segurança e higiene, para poderem ter acesso a licença para funcionarem legalmente.
Apesar de tudo isto, o modelo legalista debate-se com vários problemas, nomeadamente no âmbito do tráfico de pessoas para exploração sexual.
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Modelo abolicionista: Suécia, Noruega e França
Também conhecido como "modelo nórdico", ou "modelo sueco", esta abordagem criminaliza os clientes e a compra de serviços sexuais. Mas xs trabalhadorxs do sexo são poupadxs.
Adotado em países como Suécia, Noruega, Irlanda do Norte e França, este modelo também criminaliza os donos de bordéis, seguranças, proprietários de imóveis, entre outrxs profissionais que possam estar envolvidos no circuito do Trabalho Sexual.
O objetivo é acabar com a atividade, reduzindo a procura por serviços sexuais e combatendo a exploração de pessoas, e a violência.
Contudo, as organizações que apoiam trabalhadorxs do sexo acreditam que este "modelo nórdico" acaba por colocar a vida destas pessoas em risco, prejudicando os seus direitos humanos mais fundamentais.
Modelo proibicionista: EUA e Rússia
Em países como Rússia e em 49 dos 50 estados dos EUA, o Trabalho Sexual é completamente ilegal, e tanto xs trabalhadorxs como xs clientes podem ser penalizadxs.
O Nevada, estado na região oeste dos EUA, permite o Trabalho Sexual em bordéis regulamentados em algumas zonas específicas - e não é permitido, por exemplo, em cidades grandes como Las Vegas. Portanto, mesmo no estado norte-americano que permite a atividade, a prática é muito restritiva.
Na Rússia, o crime de proxenetismo (exploração de trabalhadorxs do sexo por terceiros) é punido com penas severas.
Estas realidades levam xs profissionais do sexo a trabalhar de forma clandestina, o que aumenta os riscos de exploração e tráfico humano.
Aproveita para ver: Plano AproXima lança Guia de apoio a trabalhadorXs do sexo
Qual é o modelo ideal para o Trabalho Sexual?
Esta é uma pergunta que continua a gerar debate e a dividir opiniões — até mesmo entre associações que trabalham todos os dias com profissionais do sexo para melhorar as suas condições de vida.
Há muitas formas de ver o tema, e isso só mostra como é essencial falar sobre ele com seriedade, ouvindo quem realmente vive esta realidade.
O Plano AproXima tem uma visão pró-direitos: acredita que quem trabalha no sexo deve poder fazê-lo com segurança, dignidade e acesso a direitos sociais e laborais — como qualquer outra pessoa que trabalha.
Para que isso aconteça, é essencial criar um espaço de diálogo e construção conjunta, a nível nacional. Um espaço onde se sentem à mesma mesa trabalhadorxs do sexo, profissionais da área social, pessoas com experiência em políticas laborais e representantes legais, para encontrar um modelo que funcione em Portugal — que seja realista, eficaz e que respeite os direitos humanos.
Mais do que impor soluções de cima para baixo, no Plano AproXima acreditamos na importância de reconhecer a autonomia de quem está no trabalho sexual, e de garantir que ninguém fica à margem da sociedade ou da lei.
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Plano AproXima
O Plano AproXima é um projecto financiado pelo Classificados X que se destina a trabalhadorxs do sexo, independentemente do género, orientação sexual, nacionalidade ou condição social. Temos uma postura livre de moralismos e preconceitos em relação ao trabalho sexual, pois acreditamos que todas as pessoas que decidem seguir esta actividade como profissão são auto-determinadas e devem ver garantidas a igualdade de oportunidades e os direitos fundamentais.
Visita-nos no website https://www.planoaproxima.org/ onde poderás encontrar informação importante e contactar a equipa directamente para esclareceres as tuas dúvidas.