25 Juni, 2024 Projeto Bússola dá apoio psicológico online gratuito a pessoas LGBTQIA+
Parceiro do Plano AproXima foi pioneiro no Alto Minho, mas chega a todo o país.
Nasceu numa pequena localidade de Guimarães, no distrito de Braga, mas presta apoio psicológico online gratuito, ajudando pessoas LGBTQIA+ de todo o país. Vem conhecer o projeto Bússola.
Em termos legislativos, Portugal é considerado um dos países mais progressistas no que se refere aos direitos das pessoas LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais, Assexuais e demais orientações sexuais e identidades de género). Mas "a legislação acaba por não ter a repercussão que devia ter na prática" e "ainda há muito por fazer", considera a psicóloga Inês Gonçalves, coordenadora do projeto Bússola, em declarações ao Classificados X
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Este projeto apoia a comunidade LGBTQIA+, nomeadamente com consultas psicológicas gratuitas, numa altura em que estas pessoas "sinalizam cada vez mais discursos de ódio" e comentários preconceituosos nas redes sociais, que têm "um impacto tremendo" na sua saúde e bem-estar, como sublinha Inês Gonçalves.
"Ler um comentário discriminatório é o suficiente para acontecer um gatilho para uma crise emocional", explica a psicóloga. "São uma série de micro agressões que vão acontecendo ao longo do tempo" e que acabam por deixar a pessoa numa "situação de grande fragilidade", diz ainda.
Neste sentido, o Bússola que integra a rede de parceiros do Plano AproXima, surge, muitas vezes, como o único porto de abrigo para pessoas em momentos de muita vulnerabilidade.
Como nasceu o Bússola
O projeto nasceu em 2021, na Casa do Povo de Fermentões (CPF) que se localiza na freguesia com o mesmo nome em Guimarães, no distrito de Braga. Foi uma "iniciativa individual" do psicólogo Carlos Oliveira que integrava esta Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) que desenvolve atividades sociais, culturais, desportivas e recreativas para públicos de várias idades.
Nos primeiros tempos, o Bússola viveu do "voluntariado" de Carlos Oliveira que já não está ligado ao projeto. O psicólogo começou por destinar um horário por semana para fazer atendimentos presenciais no gabinete de inclusão e apoio à comunidade LGBTQIA+.
Mas, em 2023, o projeto recebeu um apoio do Estado de cerca de 42 mil euros, através de um protocolo com a Secretaria de Estado da Igualdade, que permitiu o funcionamento a tempo inteiro. Foi também possível contratar mais umx técnicx - atualmente, a equipa é constituída por duas pessoas, ambas psicólogas, incluindo Inês Gonçalves que é também a coordenadora do Bússola.
Apoio psicológico online chega a todo o país
O Bússola foi pioneiro no Alto Minho como a primeira resposta focada no apoio à comunidade LGBTQIA+, focando-se no combate à discriminação e ao preconceito, na defesa dos direitos humanos, e do direito que cada um tem a ser feliz.
O apoio psicológico gratuito a pessoas LGBTQIA+ e às suas famílias é o principal foco do projeto. Para isso, realiza atendimentos presenciais na sede em Fermentões. Mas também tem protocolos com municípios e entidades, nomeadamente com a APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) de Braga e com as autarquias de Vizela e de Esposende.
Além disso, faz atendimento psicológico online, o que permite chegar a qualquer ponto do país.
Para usufruir deste serviço de psicologia, basta enviar um email para bussola@somoscpf.pt, fazer um contacto telefónico para +351 915 986 853, ou preencher o formulário no site do Bússola. A inscrição pode ainda ser feita através do Instagram e do Facebook do projeto.
Depois desse primeiro contacto, os responsáveis do Bússola fazem o encaminhamento do caso.
Há dois critérios de prioridade nos atendimentos
Mas com apenas dois profissionais ao serviço, é sempre necessário algum "jogo de cintura" para organizar os atendimentos, uma vez que há "sempre lista de espera”, embora “nunca muito longa", como repara Inês Gonçalves ao Classificados X
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Para agilizar os atendimentos, estão definidos dois critérios de prioridade: as pessoas não podem ter condições económicas para pagar um serviço particular e têm de ser vítimas de algum tipo de violência.
Quando não existe disponibilidade para fazer o atendimento, não sendo possível conciliar as possibilidades de ambas as partes, as pessoas são encaminhadas para outros serviços onde exista uma alternativa de apoio especializada idêntica. Mas, nestes casos, já é preciso que tenham meios financeiros para pagar as consultas.
Quem procura ajuda no Bússola
A maioria das pessoas que recorre ao acompanhamento psicológico no Bússola não é da região de Guimarães, apesar de estar aí sedeado. Inês Gonçalves não sabe explicar porque é que isso acontece, mas pode ter a ver com "algum receio de exposição", por se tratar de uma "cidade pequena", diz.
Entre os atendimentos realizados, há "muitas pessoas de Lisboa" e "muitas pessoas da região do Porto”, com alguns casos "residuais do Alentejo, ou mais a sul", revela a coordenadora do projeto.
O apoio chega a "pessoas de todas as faixas etárias", desde crianças a pessoas de meia-idade, mas quem mais procura ajuda são jovens adultos, dos 18 aos 30 anos de idade.
Este é um grupo populacional que enfrenta alguma "instabilidade profissional" e, portanto, "maior vulnerabilidade" em termos económicos, o que os leva ao serviço gratuito do Bússola, como nota Inês Gonçalves.
"A população idosa não nos chega, não acompanhamos nenhuma situação de uma pessoa que já esteja nos 65 anos, ou acima disso", acrescenta a psicóloga, frisando que a pessoa com mais idade a que já prestaram apoio "ronda a casa dos 50 [anos]".
Por que procuram apoio psicológico
Quanto aos problemas, ou desafios, que levam as pessoas às consultas de psicologia no Bússola, Inês Gonçalves revela ao Classificados X
que são "maioritariamente, quadros depressivos ou ansiosos, com tendência suicida associada".
Esta profissional repara ainda que os "indicadores" sociológicos relativos à comunidade LGBTQIA+ apontam que estas pessoas "são mais pobres, não por conta da sua orientação sexual e identidade de género”, mas devido ao “estigma” e à “discriminação a que são sujeitas".
Além disso, vivem situações de "isolamento" por serem "pessoas mais sozinhas", seja porque "a família as rejeita, ou expulsa de casa", ou porque se "distanciam" dos entes mais próximos por terem "receio" de se assumir, analisa a coordenadora.
"Há pessoas que nos dizem que não têm uma única pessoa com quem passar o Natal, ou a quem ligar quando estão mal. Muitas vezes, acabamos por ser a única rede de suporte" que têm, indica Inês Gonçalves.
Tudo isto requer muita "sensibilidade" e "disponibilidade", até a nível pessoal, de quem se dedica ao projeto Bússola, para entender que, em certos casos, “aquela pessoa não tem mais ninguém a quem recorrer", conclui a psicóloga.
A liberdade de ser. Viver como pessoa trans em Portugal
Chegam "poucas vítimas" de violência doméstica
O Bússola integra a Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica e o grupo de acompanhamento de saúde LGBTQIA+ do Ministério da Saúde. Mas tem recebido "poucas vítimas", o que se pode explicar pelo facto de a Câmara Municipal local também prestar apoio neste âmbito, embora não seja específico para esta comunidade.
Há poucos dados estatísticos sobre a violência doméstica neste contexto, até porque o processo pode ser ainda mais complexo do que já é entre a comunidade heterossexual.
"A questão de se reconhecer como vítima faz com que a pessoa tenha que fazer um caminho auto forçado: assumir-se como vítima e como pessoa de uma minoria sexual ou de género - uma pessoa trans, homossexual, lésbica, ou outras identidades de género ou orientações/características sexuais", nota Inês Gonçalves.
E depois, como constata a psicóloga, o atendimento dxs técnicxs que fazem o acolhimento às vítimas acaba por sujeitá-las "a uma experiência de revitimização", não respeitando os pronomes que escolhem, nem o nome social.
"Para estas pessoas, fazer uma denúncia acaba por ser uma experiência traumatizante", sublinha a coordenadora do Bússola, notando que acabam por ficar "marginalizadas" porque xs técnicxs têm falta de competências, ou preconceitos.
Prevenir bullying contra pessoas LGBTQIA+ nas escolas
Outro eixo de atuação do Bússola passa pela sensibilização, formação e consultoria a instituições, nomeadamente com sessões de formação em escolas, instituições de saúde e municípios.
Inês Gonçalves repara que tem existido um "aumento de pedidos", o que denota uma preocupação crescente com as temáticas LGBTQIA+.
Nas escolas, as sessões são focadas na prevenção do bullying, mas a falta de recursos humanos não permite fazer uma intervenção mais continuada para "cimentar os conhecimentos" entre xs estudantes e trabalhar "atitudes positivas", lamenta Inês Gonçalves.
Contudo, apesar de serem ações pontuais, "não deixam de ser importantes", até porque a maioria dxs alunxs "nunca ouviu falar destas temáticas na escola, embora isto esteja consagrado no currículo da disciplina de Cidadania", sublinha a psicóloga.
"Muitas vezes, xs professorxs também não têm formação e não se sentem à vontade para trabalhar estas questões com xs estudantes", acrescenta.
Jovens encaminhadxs por escolas e CPCJ
O Bússola também recebe casos de adolescentes encaminhadxs pelas escolas e pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) numa articulação com a comunidade e as suas instituições.
Existe uma "ficha de referenciação" nesse sentido, para encaminhar para o projeto os casos a que não conseguem dar resposta.
"O que é mais comum são questões relacionadas com identidade de género - jovens trans, queer e não binárixs", refere Inês Gonçalves, realçando que alguns psicólogxs das escolas e outros técnicxs não sabem o que fazer para xs ajudar, e reconhecem que o melhor é um atendimento especializado.
Assim, enviam-nos para o Bússola para que este projeto os ajude no "processo de autodeterminação, de autoconhecimento e de exploração da sua identidade de género", aponta a coordenadora. Mas o apoio pode também passar pelo encaminhamento para serviços de saúde, designadamente de endocrinologia ou sexologia.
Contactos do Projeto Bússola
- Morada: Largo da Casa do Povo, 4800-180 Fermentões, Guimarães
- Telemóvel: +351 915 986 853
- Email: bussola@somoscpf.pt
- Site oficial
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Especial Associações - Anda conhecer melhor quem apoia trabalhadorxs do sexo e não só:
Gina Maria
Jornalista de formação e escritora por paixão, escreve sobre sexualidade, Trabalho Sexual e questões ligadas à realidade de profissionais do sexo.
"Uma pessoa só tem o direito de olhar outra de cima para baixo para a ajudar a levantar-se." [versão de citação de Gabriel García Márquez]
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