09 abril, 2015 Afinal, o trabalho no mundo do sexo escraviza ou liberta?
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O trabalho sexual existe desde tempos imemoriais - não é à toa que se fala na mais velha profissão do mundo! Há tantos anos existe também o debate, intenso e infindável, em torno da sua legalização ou não, da moralidade e por aí fora. Mas afinal, o trabalho no mundo do sexo escraviza e subjuga ou liberta e dá empoderamento?
O trabalho no sexo é trabalho
Independentemente de ser proibido ou de ser uma actividade plenamente legalizada, o trabalho sexual existe. E existe porque há procura, razão que justifica todas as actividades económicas do mercado. Mas queremos debruçar-nos sobre aquilo que a profissão representa, afinal, para os seus trabalhadores.
É preciso notar que há quem seja forçado a entrar neste mundo, seja por indivíduos específicos, alguns dos quais próximos do seu entorno familiar, seja por redes de tráfico de pessoas. Nestes casos, o exercício da profissão tem na génese e na sua continuidade uma escravidão evidente, não sendo uma escolha pessoal. Estamos face a situações criminosas que não podem, assim, entrar no domínio do nosso debate.
Queremos focar-nos nos trabalhadores e nas trabalhadoras do sexo que enveredam por esta profissão de livre vontade, que a exercem na plenitude da sua liberdade enquanto cidadãos adultos cientes dos seus direitos e deveres.
"O trabalho no sexo é trabalho, uma actividade que gera rendimentos e que é, de muitas formas, semelhante a outros trabalhos e, de outras maneiras, diferente", refere, de forma bastante sintética e lúcida, Melissa Petro, uma ex-trabalhadora do sexo que agora dá formação nesta área e que escreve sobre o assunto em diversas publicações.
O factor dinheiro
O trabalho sexual implica a troca de algum tipo de experiência relacionada com o sexo por alguma forma de pagamento. As pessoas enveredam por este tipo de actividade por uma diversidade muito grande de razões. A larga maioria fá-lo-á por motivos económico-financeiros, mas esse, afinal, é o grande motivo porque 99% dos trabalhadores de todas as actividades em geral trabalham!
Todavia, e como faz evidência a performer "queer" porno Kitty Stryker, o trabalho no mundo do sexo não é visto como qualquer outro trabalho o é, embora seja possível encontrar pontos de semelhança e nos empregos ditos normais haja também muitas situações de exploração e de más condições laborais.
"Já estive em todo o lado na indústria do sexo, de modelo de nus a acompanhante, a trabalhar como Dominatrix e como performer porno. Como tal, perguntam-me muitas vezes se o trabalho no sexo me dá poder, se é seguro, ou se me sinto moralmente corrompida por ele. Para conteztualizar: nunca me perguntaram estas coisas em referência a trabalhar como um estagiário não remunerado. Nunca me fizeram estas questões sobre o meu trabalho - tanto mal pago como com excesso de horas - no departamente de marketing de uma companhia de desporto. Nunca me perguntaram isso sobre o trabalho no retalho - um trabalho onde o assédio sexual era rotina e onde denunciá-lo podia levar ao despedimento."
Estes são dados bem interessantes para o nosso debate, aos quais podemos ainda acrescentar a teoria feminista de que, pelo trabalho no sexo, a mulher se liberta das garras do moralismo com que ainda é tratada por uma sociedade que tenta insistentemente controlar o seu corpo e a sua sexualidade. Há quem defenda que, por via do trabalho sexual, algumas mulheres conseguem um "empoderamento" que não teriam de outro modo, porque a profissão lhes permite atingirem autonomia e independência.
Estamos aqui a falar da livre escolha por uma profissão que permite melhores rendimentos financeiros e uma liberdade de gestão de horários que um emprego de outro tipo não permitiria.
Mas, em contraposição, surge a ideia de subjugação da trabalhadora ou do trabalhador do sexo aos desejos do cliente. Está em causa a ideia do sentimento de posse, de poder comprar e dispor, como bem lhes aprouver, do corpo de outrém, o que coloca em causa a ideia de liberdade de quem faz este tipo de trabalho sexual.
A trabalhadora do sexo e activista neste domínio Siouxsie Q. James resume, de uma forma muito precisa, aquilo que, no fundo, está em causa na hora de enveredar por um trabalho no mundo do sexo.
"Para alguns, o trabalho no sexo é um meio para um fim - uma forma de viver numa economia que os traiu. Para alguns, o trabalho no sexo é uma aventura - um momento de poder ou um tempo estranho nas suas vidas que lhes ensinou alguma coisa sobre si próprios, para o bem e para o mal. Para alguns, o trabalho no sexo é um trabalho que não escolheram; um trabalho que as circunstâncias ou alguém os forçou a fazer. Para mim, o trabalho no sexo tem sido um caminho para o sonho americano - uma forma de eu subsistir à minha família, de ter o meu próprio negócio e de fazer o meu percurso rumo à estabilidade financeira a longo prazo."
No fundo, a resposta à pergunta inicial do artigo está simplesmente dentro de cada trabalhador e de cada trabalhadora do sexo. Cada um conhecerá as suas razões... Ou deverá procurá-las melhor dentro de si.
Mas, afinal, aquilo que importa é que os trabalhadores e as trabalhadoras do sexo têm direitos e direito a trabalhar em segurança e a serem tratados e tratadas com a dignidade e o respeito que todos os trabalhadores merecem.
Gina Maria
Jornalista de formação e escritora por paixão, escreve sobre sexualidade, Trabalho Sexual e questões ligadas à realidade de profissionais do sexo.
"Uma pessoa só tem o direito de olhar outra de cima para baixo para a ajudar a levantar-se." [versão de citação de Gabriel García Márquez]
+ ginamariaxxx@gmail.com (vendas e propostas sexuais dispensam-se, por favor! Opiniões, críticas construtivas e sugestões são sempre bem-vindas)