23 septembre, 2021 Relato: Trabalhei por 5 Anos nos Emirados Árabes
Em 2014, comprei um bilhete de avião de Paris para o Dubai...
Me chamo Beatriz, tenho 37 anos, sou trabalhadora do sexo há 13 anos e Acompanhante de Luxo desde 2008. Comecei a trabalhar como acompanhante pois fui mãe solteira e precisava sustentar meu filho, já que o pai nunca nos prestou nenhuma assistência e apenas pagava uma pensão equivalente a 50€.
"Sou do norte do Brasil e fui para o sudeste do país para trabalhar, me dividia entre Rio e São Paulo e trabalhava exclusivamente em boates, pois gostava muito da vida noturna e o trabalho encaixava bem.
Nem sempre foi um mar de rosas, enfrentei muitos altos e baixos, mas sempre me mantive firme, pois o trabalho sexual sempre foi e continua sendo minha fonte de renda.
Logo surgiram oportunidades de trabalhar na Europa. Os primeiros países em que trabalhei foram Espanha, onde não gostei, e França, onde adorei e aprendi a ser uma Escort de Luxo, a trabalhar de forma independente, gerenciar e-mails, responder telefonemas e a falar francês.Na época, poucas meninas tinham condições de viajar do Brasil para a Europa e o trabalho também era diferente do que é hoje. Já trabalhei em vários países da UE como Bélgica, França, Espanha, Itália, Mónaco, e também no Reino Unido, Inglaterra, Escócia e Irlanda.
Em 2014, quando já trabalhava de forma independente, um amigo que também fazia trabalho sexual sugeriu que eu deixasse Paris, onde morava na época, e fosse para o Dubai.
Comecei a estudar os costumes, os sites e como funcionava o trabalho sexual nos Emirados Árabes. Já fui sabendo que o trabalho sexual é crime sujeito a prisão e deportação, mas, mesmo assim, comprei um bilhete de avião de Paris para o Dubai e em 7 horas, estava aterrando no território árabe.
A cidade é cheia de luxo e encanto, fiquei impressionada principalmente com os serviços nos restaurantes e hotéis que eram sempre impecáveis.
Não foi difícil adaptar-me à vida no Dubai - com o luxo que a cidade oferece e com o que o seu dinheiro pode pagar, tudo se torna maravilhoso!
Morei dois meses em um aparthotel e depois fui fazendo conexões... Uma colega de trabalho que já estava indo embora do Dubai me ofereceu o apartamento onde ela estava morando em Downtown, em frente ao Burj Khalifa.
Tinha uma vida muito confortável no Dubai, morei lá por 5 anos e tive muitas experiências boas e ruins também.
A vida no Dubai é muito cara e, com o tempo, percebi que as pessoas viviam de ostentação, ou seja, gastavam o que não tinham para sustentar uma vida de luxo que não podiam pagar e isso foi-me causando certo incómodo.
A comida e os alugueres eram também caríssimos na região em que morava. Não podia morar em um lugar mais barato, pois tinha que sustentar o status de uma acompanhante de luxo.
Tinha o medo constante de ser surpreendida pela visita da polícia e de clientes maldosos. Com o tempo vivendo lá, sabíamos de histórias horríveis sobre clientes, garotas que eram roubadas, estupradas, espancadas e até mortas. Clientes que pediam dinheiro após o serviço, garotas forçadas a atender clientes sem uso de preservativo, entre outras coisas que se te contar daria um livro com muitas páginas.
Ser trabalhadora do sexo no Dubai não é pra qualquer uma - o medo e a pressão psicológica de que algo de ruim vai acontecer são constantes.
Essa sensação de insegurança constante, muitas pessoas que vivem lá tinham, inclusive os próprios clientes, pois as leis em países árabes são regidas pelo Islã, então qualquer coisa que nós ocidentais consideramos banal podia ser uma ofensa para eles. Eu sempre fui muito discreta com o que vestia e sempre tentava passar despercebida nos lugares, pois o Dubai é uma cidade muito vigiada.
Durante a minha permanência nos Emirados fui duas vezes ao Qatar, a primeira fui estuprada, ameaçada com uma arma de choque elétrico e roubada, saí de lá com a ajuda de um cliente que me fez um envio de dinheiro para que eu voltasse para o Dubai, onde morava.
Fiquei com muito medo a partir de então e mesmo depois desse episódio, eu precisava trabalhar, sentia pavor de todos os clientes que vinham até meu apartamento ou quando fazia deslocações, durante o serviço ficava tensa, e muitas coisas passaram pela minha cabeça. Só o tempo me fez superar.
Na segunda vez, fui trabalhar para uma agência, onde tudo correu muito bem a nível de clientes, eram bons clientes, já conhecidos, sem perigo.
Mas a pedido da agência, eu estava hospedada em um hotel e sempre ficava com medo de descobrirem que eu estava a receber clientes no meu quarto. Segundo a lei islâmica, as mulheres solteiras não podem receber visitas de homens no quarto, mesmo que não sejam mulçumanas.
Na época em que estive lá, a lei dos países árabes não protegia muito as mulheres, então se uma mulher fosse estuprada, ela poderia ser presa e cumprir pena por isso.
Financeiramente, compensa muito ir ao Qatar, mas o risco de ser violentada, deportada, e presa é de 95%. Eu tive sorte!
Deixei por um tempo de trabalhar em países árabes e fiz do Dubai a minha casa. Comecei a trabalhar na Ásia, em países como China, Hong Kong e Singapura. Fiz turnê pela Nova Zelândia também. Foram períodos mais tranquilos e satisfatórios financeiramente. Voltava ao Dubai somente para descansar, pois geograficamente, dos Emirados era mais fácil para viajar para esses países.
Com esta experiência, aprendi que não vale a pena correr riscos por dinheiro em países estranhos, recebendo homens estranhos, onde estava exposta a todos os riscos possíveis.Hoje, a minha vida é bem tranquila em Portugal, trabalho selecionando clientes, ganho bem menos, talvez um terço do que ganhava nos outros países onde morei e viajei. Mas, aqui, consegui ter uma rotina, coisa que eu não tinha antes, pois eu vivia em aeroportos, viajando de um país para o outro sem parar.
Tenho a cabeça mais descansada e faço tratamento para Ansiedade e Síndrome do Pânico que desenvolvi durante as minhas jornadas ostensivas de trabalho.
Faço meditações, exercícios físicos, não consumo álcool ou outras substâncias e nem fumo, tenho paz e tranquilidade mental.
Gosto de Portugal.
Para quem está a pensar em trabalhar nos Emirados Árabes, digo que é preciso muita coragem, equilíbrio mental, cuidado, dinheiro de reserva - se possível, é preciso deixar uma quantia com alguém de confiança que possa te fazer um envio no caso de ser roubada.
E sem a expectativa de que vais encontrar um homem rico árabe que vai te tirar dessa vida e te dar uma vida de luxo! Eu acredito que essas histórias acontecem, mas são casos raros. A cultura deles é totalmente diferente da nossa e a mulher não tem tantas liberdades e direitos como no ocidente.
A única vantagem é a oportunidade de conhecer outra cultura, lugares diferentes, e de aperfeiçoar idiomas. Enquanto estive lá conheci lugares fantásticos ao redor do mundo! Mas não creio que, hoje em dia, os países árabes deem alguma vantagem financeira, pois a vida é muito cara nesses lugares e para manteres um estilo de vida que te deixa no mínimo satisfeita, tens que gastar muito.
Não é lugar onde se economiza e vive com pouco, porque as classes são bem divididas.
Para captar clientes que paguem um cachê alto, você precisa estar à altura, com bolsas e sapatos de grife, e frequentar lugares caros como restaurantes de chefs renomados com estrelas Michelin. Precisa estar bem localizada e os alugueres são caríssimos no Dubai, cerca de 3000€ em uma área nobre da cidade onde os clientes possam te visitar. Tendo em conta custo e benefício, hoje não vale a pena, pois a moeda sofre oscilações.
O Dubai foi bom financeiramente há uns 7 anos, hoje sempre ouço depoimentos de meninas que investiram muito dinheiro e não obtiveram retorno.
Desenvolvam suas habilidades intelectuais, estudem, se formem em alguma coisa para não ficarem dependentes do trabalho sexual que, como todas nós sabemos, sofre oscilações o tempo inteiro e estamos sempre à mercê da sorte.
Eu falo inglês fluente e estou estudando, atualmente, para fazer o IETLS, pretendo ingressar em alguma instituição de ensino estrangeira.
Tenho muitas expectativas sempre positivas a respeito do futuro e acho que já estou na fase final da minha carreira como acompanhante. Aprendi coisas boas, passei por experiências ruins, mas acredito que não poderia ser diferente na minha vida.
Pretendo continuar fazendo trabalho sexual, mas não por muito tempo, pois já estou estudando formas de migrar para uma outra profissão a qual eu goste. Sou muito ligada à moda, beleza, tecnologia e pretendo também fazer trabalhos sociais que me tragam enriquecimento como pessoa.
A vida tem altos e baixos para todos, mas o importante é seguir em frente na direção dos próprios objetivos."
Quero agradecer imensamente à Beatriz por abrir seu coração e contar um pouco da sua história.
Espero que este relato também sirva como uma luz para quem pensa ou já pensou em trabalhar nos Emirados Árabes.
Se você tem algum relato que deseja partilhar, entre em contacto comigo, terei todo o gosto em ouvir-te e contar a sua história.
Um beijo grande!
Suzana F.
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Suzana F.
Suzana F. é mente aberta, observadora e crítica por natureza. Apaixonada por literatura, ama ler e escrever sobre sexo.