16 Febrero, 2021 Crónicas da Lábia: De decências e indecências...
O que a série de televisão “Masters of sex” nos pode ensinar…
Ando a ver a série "Masters of Sex" sobre a dupla William Masters e Virginia Johnson que foi pioneira na investigação sobre sexualidade humana. É uma excelente história para quem se interessa pelo tema do sexo e o melhor é que é contada numa perspectiva bastante feminina.
A série passa-se nos anos de 1950 a 1960, e foca-se nas histórias de William Masters ((Michael Sheen), um respeitado médico com uma vida sexual enfadonha, e de Virginia Johnson (Lizzy Caplan), uma mulher divorciada, com dois filhos, que vive a sua sexualidade em pleno, sem medo de procurar o seu próprio prazer.
Virginia torna-se assistente de William nas pesquisas do médico sobre sexo e o seu papel acaba por ser determinante na forma como ele vai encaminhando a investigação, no sentido de explorar a sexualidade feminina e de encontrar respostas para vários tabus.
Não vou aqui deixar nenhum spoiler falando da história propriamente dita - não quero estragar o prazer de descobrir a série a ninguém! O que quero realçar é a forma inteligente como se fala não apenas de sexo, mas dos preconceitos em torno dele e dos mitos sobre o prazer.
Num dos episódios da primeira temporada, refere-se Freud e o facto de este acreditar que o orgasmo clitoriano é "um fenómeno de adolescentes". Para o famoso psicanalista, uma mulher adulta dita normal teria orgasmos apenas através do coito. As que não o conseguem, dizia Freud, apresentam "um desenvolvimento deficiente", num sinal de "frigidez sexual" que precisaria de tratamento psiquiátrico para ser resolvido!
Ora, Masters e Johnson acabaram por desfazer o mito de Freud. Mas eles enfrentaram muitas dificuldades para realizarem os seus estudos que passavam por observar pessoas a masturbarem-se ou casais a terem sexo, de modo a verificarem e a apontarem as reacções dos respectivos corpos.
Na altura, os seus estudos foram catalogados como "indecentes" e provocaram um verdadeiro escândalo! Inicialmente, até tiveram que recorrer a trabalhadorxs do sexo para realizarem as investigações porque, evidentemente, as pessoas "decentes" não poderiam participar.
Ao longo dos primeiros episódios da série, que foi os que vi até agora, é marcada essa dualidade entre a "decência" e a "indecência". E é óbvio que Virginia representa o lado mais "indecente" porque é uma mulher que vai para a cama com quem quer e quando quer, explorando aquilo que lhe dá prazer.
A "decência" e a "indecência" ainda são, actualmente, termos que marcam a vida das mulheres e que, de algum modo, as condicionam na forma como vivem a sua sexualidade.
O prazer feminino continua a ser, de certa forma, um tabu. E muitas mulheres têm dificuldades em atingir o orgasmo numa relação a dois. Porque, no fundo, vivem sempre entre essa dualidade, entre a "decência" e a "indecência", entre o que desejam e o que não devem fazer...
A verdadeira revolução sexual acontece, nas mulheres, quando elas conseguem fugir desse rótulo e, assim, vivem os seus corpos e desejos sem pensarem na forma como a sociedade as pode catalogar.
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Gina Maria
Jornalista de formação e escritora por paixão, escreve sobre sexualidade, Trabalho Sexual e questões ligadas à realidade de profissionais do sexo.
"Uma pessoa só tem o direito de olhar outra de cima para baixo para a ajudar a levantar-se." [versão de citação de Gabriel García Márquez]
+ ginamariaxxx@gmail.com (vendas e propostas sexuais dispensam-se, por favor! Opiniões, críticas construtivas e sugestões são sempre bem-vindas)