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23 agosto, 2020 Trabalho Sexual e Qualidade de Vida

Há uns bons anos atrás, numa fase bem difícil da minha vida...

Há uns bons anos atrás, numa fase bem difícil da minha vida, eu precisei morar em pensões e convivi muito com meninas que faziam convívio. Eram casas grandes com vários quartos, a cozinha e a lavandaria eram partilhadas, então acabávamos sempre por conversar um pouco nestas zonas e eu ficava a conhecer um pouco da história de vida delas.

Trabalho Sexual e Qualidade de Vida

A maioria trabalhava na noite, nas ruas, em boates, casas de convívio e bares de alterne. Eram mulheres de vários estados do Brasil que vieram para um grande centro urbano em busca de uma vida melhor e por não conseguirem trabalhos ditos “normais” viram-se na necessidade de fazer convívio para sobreviverem.

Algumas tinham filhos que moravam com os familiares deixados nas cidades de onde vieram, umas eram estudantes de universidades particulares, algumas vieram em busca de trabalhos como modelo e faziam o tal “Book Rosa”. Cada uma tinha uma história, um jeito de ser, mas uma coisa que eu via em comum em todas elas era a má qualidade de vida. Dormiam pouco, usavam drogas para conseguirem trabalhar, abusavam do álcool, mal tinham contacto com a família porque naquela época ter um computador com internet ainda era luxo, não tinham amigas, alimentavam-se a base de comidas pré-prontas e instantâneas, as modelos então, viviam a fazer jejum e poucas praticavam algum tipo de actividade física.

Mesmo com o pouco contacto que tive com essas mulheres, era notável o quanto a vida delas não era fácil. Vez ou outra eu levava alguma comida fresca num pote para uma vizinha de porta, já acompanhei uma delas ao hospital porque foi agredida por um cliente, já dei suporte durante uma crise de choro e até mesmo entreguei currículo numa empresa que eu trabalhava a ver se conseguia um outro trabalho para uma delas.

Eu sempre tive uma grande empatia e respeito por essas mulheres e colocava-me à disposição caso precisassem de alguma coisa, porque eu via o quão difícil era a vida delas mesmo fora do mundo do sexo.

E hoje, mesmo a trabalhar apenas como camgirl, eu vejo o quão importante é ter uma vida fora do trabalho sexual. Não consigo imaginar-me neste mesmo cenário sem ter contacto com minha família e com amigos, ainda que eles não saibam o que eu faço para pagar minhas contas. Não consigo ficar um dia sem ir ao ginásio exercitar-me porque isso é algo que alivia e muito o estresse do dia a dia. Gosto de ter tempo para cozinhar e preparar uma refeição adequada. Gosto de estudar e investir em mim mesma.

Parece pouca coisa, mas eu valorizo cada detalhe da minha vida fora da web, pois certamente sem isso eu ficaria maluca. E sou mesmo muito grata ao meu marido que me apoia e dá-me todo suporte do mundo quando estou num dia mau emocionalmente e não consigo atender.

Minha vida está longe de ser maravilhosa, mas eu tento pelo menos torná-la a cada dia um pouco melhor com estas pequenas coisas, porque isso para mim já é ter uma boa qualidade de vida e eu invisto nisso de alguma forma, ainda que às vezes até com um certo sacrifício.

Não vivo apenas para o trabalho, ele é algo necessário que faz parte da minha vida para poder suprir minhas necessidades básicas e investir no meu bem estar, que ao meu ver é o que importa, pois de que adianta ganhar rios de dinheiro e perder minha sanidade física e mental por causa de algo que não vou levar para o túmulo?

Viver não é fácil, todo mundo tem os seus problemas, seus demônios internos para lutar, mas é sempre possível escolher como encarar a vida.

Cuidem do vosso bem estar, seja de qual forma for possível, pois o nosso amanhã depende das escolhas que fazemos hoje.

Com amor!

Suzana F.

Suzana F.

Suzana F.

Suzana F. é mente aberta, observadora e crítica por natureza. Apaixonada por literatura, ama ler e escrever sobre sexo. 

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