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17 mai, 2024 Mentes Conectadas: A importância de enfrentar a realidade

Aprendi que se deve enfrentar a realidade de uma forma muito caricata...

Veio até mim um pedido de ajuda não explícito de alguém que tinha dúvidas sobre a sua família, e por isso achei que deveria publicar aqui.

Mentes Conectadas: A importância de enfrentar a realidade

Filho de mãe emigrante há muitos anos, foi deixado com os avós aos 4 anos de idade.

Também tinha uma irmã que terá sido levada para o estrangeiro. O único que ficou foi este filho na casa dos avós, onde começou a experienciar o abandono, pois sentia uma grande angústia quando tinha de ficar à espera do telefonema da sua mãe.

As saudades e o não compreender o porquê de ter ficado para trás, e a angústia que sentia quando o telefone era desligado, é algo que ainda não esqueceu e que ainda dói profundamente!

Hoje com 53 anos, infelizmente, não conseguiu ultrapassar isso e vê-se sozinho a morar num quarto.

A mãe tem uma casa livre na terra dela, mas não lha disponibiliza e deixa-o a pagar um quarto, sozinho, sem amigos por perto. Na terra, teria os seus amigos de infância, seria mais fácil.

Desde que está neste quarto alugado, vê-se a olhos nus o quanto este homem emagreceu, pois ele separou-se há pouco tempo, deixando para trás uma relação de muitos anos.

Após estes anos todos, esperou por aquele telefonema da mãe para lhe dizer para ir para ao pé dela no estrangeiro, tal e qual como quando ele era pequeno, e claro que isso não aconteceu.

Ele não consegue compreender que se não aconteceu quando tinha 4 anos e ainda era um bebé, então, aos 53 anos não vai acontecer mesmo!

Que estranha forma de amor...

Em vez disso, a mãe manda-lhe dinheiro para o ajudar nas compras e na renda da casa.

Ele agarra nesse dinheiro e vai usar drogas! Inconscientemente, é uma forma de vingança, mas, no final do dia, só faz mal a si próprio. O cérebro descompensa, a vida torna-se desgovernada, tudo é um caos!

Há pouco tempo estive com ele, e até me disse que tinha acabado de tomar banho, ao que eu lhe respondi:

- Pois, mas não está a resultar o banho, pois o cheiro da zona de consumo de drogas já se entranhou na tua pele. Cheiras-me a cachimbo de crack!

E esta é a verdade, pois algumas pessoas que usam drogas ficam a ter um aspeto e um cheiro muito próprios que se entranham na pele e nas roupas!

Foi aí que ele falou da família, e eu fiz-lhe uma simples pergunta:

- Desde que estás a morar num quarto alugado, a tua mãe alguma vez te ligou por webcam?

Claro que respondeu que não!

Fiz esta pergunta porque sei, claramente, que não faz chamadas via webcam para não ter de ver o filho magro, e não sentir a culpa. Não é nada comigo, mas eu própria sinto algum desdém desta mãe.

Em relação a este homem, não há muito a fazer, pois ele ainda não conseguiu ter um despertar espiritual.

Já me ouviu a dizer, vezes sem conta, que o problema foi ele nunca ter enfrentado a infância dele de forma clara e assertiva, pois se o tivesse feito, não aceitaria nem um cêntimo desta mãe!

O meu caso pessoal

Há dois anos, o meu pai morreu e eu recusei ir receber a herança, o que foi um grande choque para quem veio a saber da minha decisão!

Tive tanta gente a maçar-me a cabeça com isso, pois tornou-se incompreensível esta minha decisão. Porque iria deixar tudo para o Estado português?! Sim, deixei, e senti-me livre e honrei-me a mim própria!

Não fui buscar a herança e, como única herdeira legal, também deixei a minha madrasta a zeros!

Para mim, seria impossível aceitar dinheiro de um homem por culpa de quem tive de esperar, diariamente, na porta de trás da igreja, ao lado da creche, para receber os restos de comida (para eu e a minha mãe podermos comer).

Eu ainda era pequena, com uns 6, 7 anos, e esperava no degrau, cheia de vergonha, porque o meu pai tinha decidido receber, sem contrato de trabalho, para não pagar a minha alimentação e roupa.

Agora iria buscar o quê? Nada teve para me dar, por isso nada quero hoje!

Por que devemos enfrentar a realidade

Conto isto porque decidi, de forma crua e nua, olhar para a minha infância, correndo o risco de descobrir o que descobri - que fui mal-amada e cuidada.

É vergonhoso saber esta verdade, mas salva-me a vida todos os dias e faz-me levantar da cama, mesmo quando estou em baixo. Costumo dizer que não tenho tempo para ter pena de mim própria!

Apesar de vergonhoso, também me trouxe a habilidade de não deixar que pessoas que se cruzem no meu caminho façam pouco de mim, pois trouxe-me a assertividade e o furacão da defesa pessoal.

Quando enfrentamos a nossa infância, temos mais possibilidades de nos tornarmos mais amorosos connosco, mais orgulhosos dos nossos feitos, mais vencedores.

Aprendi isto - que se deve enfrentar a realidade - de uma forma muito caricata. Aprendi quando comecei a questionar porque é que os meus amigos com VIH tinham mais sucesso do que aqueles que não tinham o vírus.

Ia para casa e punha-me a pensar nisso. Até que se fez luz!

Quando as coisas se tornam claras, reais e não há fuga possível, então, passa-se pelo processo de luto e renasce-se com uma nova força, motivação e objetivos.

Este homem, meu amigo, recusa-se a enfrentar a realidade de que, talvez, a mãe tenha um amor muito duvidoso por ele.

A verdade é que há pais que não sabem amar, e isso será um problema deles se escolhermos enfrentar essa realidade. Passa a ser um problema nosso que pode levar à destruição quando não se olha de frente e se evita a realidade.

Vale a pena não enfrentar a verdade? Não! Dá mais trabalho. Por vezes, pode vir a tornar-se num trabalho árduo de uma vida inteira e até levar à morte!

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